sábado, 4 de abril de 2009

Pirataria em foco

Com o fechamento da comunidade do Orkut Discografias, (re)abriu-se a discussão sobre os direitos autorais e a pirataria. Inúmeros textos e debates foram realizados desde então para discutir o tema, dentre os quais destaco os textos da revista Carta Capital, a entrevista dada por Pena Schimidt a Pedro Alexandre Sanches e o texto "Compartilhar é Preciso?" da revista Bravo!, além do debate realizado na MTV, no programa MTV Debate.

Aproveito para ressuscitar um vídeo antigo sobre o tema, no qual o advogado e professor de direito Túlio Vianna (que tem também um excelente texto sobre o tema em pdf) debate a questão com Wagner Carone, representante da Sony e uma banda independente.



Antes de mais nada, essa "guerra" contra a distribuição de arquivos na internet já nasce perdida. Não há uma centralidade nessa distribuição e a cada vez que se fecha um canal, mil outros se abrem. Há uma necessidade urgente da indústria cultural (aí inclusos também cinema e até livros) de repensar o modo de distribuição e, especialmente, de venda dos seus produtos. Não existe ainda um modelo consolidado, como defendem alguns radicais dos movimentos "livres" (radicais esses que pensam que "liberdade" é a obrigatoriedade de adotar o modelo deles), mas é claro que existem alguns caminhos novos e complementares aos modelos tradicionais, especialmente na música, que já lida com a pirataria há mais tempo.

No caso do cinema, a indústria está perdendo uma janela importante. Hoje ainda há uma janela de oportunidade enorme para que a indústria cinematográfica se renove, janela esta que poderá se fechar nos próximos anos. Digo isso porque acredito que é possível vender os filmes em formatos compactos, mas eles ainda não se deram conta disso. Acredito que existem muitos consumidores dispostos a pagar para fazer um download legal de um filme em vez de baixar na internet, principalmente se fosse lançado o arquivo na mesma época que é lançado nos cinemas (sim, eu continuaria indo ao cinema para ver os filmes mais legais...).

Não me agrada nem um pouco o discurso de defesa da pirataria quando dizem que o pirata criminoso é aquele que vende o disco. Se a pirataria se justifica pela democratização da cultura, o camelô que vende o disco por 5 reais (ou menos) é tão importante quanto a distribuição P2P, já que atinge uma parcela muito maior da população, especialmente as classes mais baixas. Nem é verdade também que a confecção desses discos piratas esteja ligada de alguma forma ao crime organizado. Na maioria das vezes, esses discos são gravados localmente, com torres de gravação de cds e de forma artesanal.

No caso da música, quem pirateia (seja pela internet ou comprando cd de camelô) quer, antes de mais nada, ouvir a música do seu artista favorito. É um amante da música. A indústria está, então, lutando contra os amantes da música, que deveriam ser os seus clientes. Além disso, muitas das músicas disponíveis na rede (a maioria até) nem estão disponíveis para venda. Onde encontro todos os discos dos Mutantes pra comprar?

O que veio de bom com o fechamento da comunidade foi a discussão aberta sobre o tema. A proibição da distribuição de músicas vai contra a tendência da sociedade atual. Como as nossas leis não vieram gravadas em pedra, uma atualização da lei de direitos autorais é extremamente necessária.

A propósito: pouco tempo depois do fechamento, surgiram várias outras comunidades similares:

http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=36805816
http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=1275219
http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=56139232

7 comentários:

  1. No caso dos músicos, estes têm feito muito mais shows pelo mundo a fora... Já que a grana não rende na vendagem de CDs e DVDs, o jeito é encarar os shows. E tem fã que vende a casa pra assistir o artista favorito.

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  2. É... mas e o escritor? como faz? e tem mais: a música do cd não é feita só de artista, tem a produção do disco, a arte da capa, a composição da música (que nem sempre é feita por quem executa)... como sobreviverão todos esses profissionais que não fazem shows?

    Parece que o problema na música é menos do artista e mais da indústria... ouvi uma entrevista da Fernanda Abreu hoje e ela falava que a interrogação do artista é se ele vai fazer um álbum com 12 músicas (com coesão entre elas e tals) ou se vai lançar música por música na rede... ou seja, o problema para o artista não parece ser a venda dos discos...

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  3. Gosto dessa discussão e acho que dá pra escrever coisas interessantes por ela. Acredito que a lei dos direitos autorais atual é platônica, no sentido de que quer "guardar as fronteiras do acesso", produzindo assim uma hierarquização pela possibilidade de acesso ao saber/cultura.
    Não acho que a pirataria rime com "democratização" em sentido político: os países do leste europeu que o digam. Suas leis mais flexiveis de direitos autorais apenas turvam as águas.É como se um país legalizasse as drogas enquanto todos os outros proíbem. Haveria conexão entre esses dois problemas? Sim se pensarmos na não limitação externa de nossas escolhas ou de acesso... o que chamam de liberdade negativa.
    Acho que essa discussão é mais uma daquelas que repõe as fronteiras entre público e privado: assistir um filme em um cinema é um ato público, em casa é um ato privado. Nesse sentido os problemas de regulamentação já existiam há tempo: vários bares/boates com música ao vivo não pagam direitos aos compositores pela execução de canções; ou transmitem jogos sem pagar os direitos devidos. A idéia que você pode fazer uso privado, mas não pode comercializar não decola... ou seja... tenho que pensar mais... só lancei idéia soltas...

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  4. E é isso mesmo, Murilo. Hoje em dia sai muito artista da net que pouco se importa com a produção de CDs, já que eles ganham uma mínima porcetagem.

    No caso dos escritores, a meu ver, eles ainda são os menos afetados financeiramente. A internet fez com que os livros fiquem mais acessíveis, não só gratuitamente, como também através do e-commerce. São poucas as pessoas que discordam de que livro bom é livro impresso. A maioria (digo "maioria" tentando não generalizar) que não compra livros e deixa para ler no computador, raramente iria comprá-lo se não o tivesse digitalmente.

    Como diria Chris Anderson, “tudo que pode se tornar digital se tornará digital, por força de suas razões econômicas. E tudo que se torna digital, se torna free na Internet”. Lutar contra isso é dar murro em ponta de faca. E, infelizmente, muita gente realmente sai prejudicada.

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  5. Marcos, acho que a "democratização", nesse caso, não tem nada a ver com o sentido político mesmo, mas com a possibilidade de acesso por todos a bens culturais. Concordo que a discussão, assim como a discussão sobre a liberalização das drogas, deve ser global, pois se for local pode agravar o problema, tanto localmente quanto globalmente.

    Sobre a questão do público/privado, sempre foi possível ver filmes locados ou ir às bibliotecas pegar livros gratuitamente. E quando vamos à locadora, por mais que esse filme tenha sido comprado uma vez, não é pago nenhum direito de exibição cada vez que ele é locado.

    Acho que a discussão sobre a remuneração poderia levar um outro caminho, com alguma centralização. Por exemplo, o Google se dispõe a pagar direitos de exibição sobre os vídeos disponíveis no youtube.

    As associações de defesa das gravadoras deveriam lutar por ou até criar espaços de distribuição centralizados de música na internet, o que só existe, por parte das gravadoras, apenas rudimentarmente, com poucas músicas disponíveis e muita burocracia para obter, e ainda com um valor muito alto (afinal, ali não teria que pagar por produção de encarte, custos de distribuição, etc).

    Alcy, acho que muitos artistas apreciam a qualidade do trabalho dos produtores, e continuarão a procurar esse tipo de trabalho (bem como o de divulgação e distribuição de músicas) e não vejo nada de mal nisso. Cada um vende seu peixe como quer ou como pode. Ainda não há um modelo fechado e acho que as gravadoras estão erradas em tentar salvar o antigo e não criar novas alternativas viáveis, o que seria o ideal: as gravadoras continuarem existindo, porém com outra abordagem, mas coexistindo com os novos modelos de distribuição, que poderiam até ser complementares aos modelos das gravadoras.

    No caso do livro, eu não compro livro. Baixo e imprimo. Livro ainda é muito, muito caro, principalmente livros técnicos de boa qualidade. Mas os literários também, em geral, não fogem disso, embora o cenário tenda por uma mudança (senão, haverá a falência das editoras).

    Quanto a ler no computador, pesquisas recentes apontam que os leitores mais jovens, especialmente as crianças, já estão mais adaptadas, e uma grande parte (bem maior do que os que se acostumaram a ler no papel) já prefere esse tipo de leitura.

    Claro que o livro, o cd, o dvd, as salas de cinema e até o vinil não vão morrer. Mas também nunca voltarão a ser como eram.

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  6. Acabei de conhecer o "Milisecs" e me impressionei com a qualidade dos textos. Forte abraço!

    http://ametricadogrito.blogspot.com
    http://restosefragmentos.blogspot.com

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  7. Seja bem vindo ao Milisecs e obrigado pelo comentário, Rogério... Esperamos poder contar sempre com os seus comentários por aqui...

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